domingo, fevereiro 28, 2010

e assim de repente...


"When a woman makes the choice to marry, to have children; in one way her life begins but in another way it stops. You build a life of details. You become a mother, a wife and you stop and stay steady so that your children can move. And when they leave they take your life of details with them. And then you're expected move again only you don't remember what moves you because no-one has asked in so long. Not even yourself. You never in your life think that love like this can happen to you."


The Bridges of Madison County


Ontem revi este filme e no meio, bem no meio dele, quando toda a acção caminha para o auge dos amantes, esta frase. Parei. O meu mundo parou na altura. Aquela frase podia ser minha. Podia ter-me saído da boca. Podia ter sido escrita num qualquer caderno. Aquela frase resume, em parcas palavras, os meus dois últimos anos.
Aquela frase fez-me ver que não quero parar. Que a minha vida feita de detalhes até há dois anos não tem de parar. Não deve, mesmo que eu tenha estagnado.
Por isso, e só por isso, voltei a fotografar e a deixar a beleza do quotidiano inundar-me de inspiração, magia e cor. Como fazia antes de a ter na minha vida. Antes de os ter.
Voltei a reactivar a minha velhinha conta no Flickr para dar seguimento a esta vontade e tomei a resolução de que a minha próxima aquisição é comprar uma máquina digital em condições.
Agora só falta recomeçar a escrever.
Mas acredito que até isso eu irei conseguir.

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

mon petit enfant terrible

Ela pode ter cara de anjo, mas a minha filha anda de me deixar com os cabelos em pé. A sério. As manhã nesta casa têm sido um drama sem fim. Os fins de tarde, idem. De manhã a gritaria começa logo assim que sai da cama. Embirrou que não quer trocar a fralda no trocador, onde guincha, esperneia e se contorce toda colocando-se de pé. Comecei a fazê-lo no chão do seu quarto, no tapete foto que lá existe, com o resguardo por baixo. Ao início achava muita piada e ficava quietinha o tempo suficiente para a mudar e vestir, mas agora... agora é para esquecer. Além disso, não há dia nenhum em que ela não saia da cama com uma valente cagada de presente para eu limpar logo pela manhã, o que se juntarmos o facto de ela não parar quieta enquanto a limpo e mudo a fralda, dá o cenário dantesco que neste momento conseguem visualizar nas vossas cabeças.
Depois vem o drama da comida. Levo-lhe o biberão à cama, passo-lho para a mão assim que acorda e se levanta e depois estou os restantes 45 minutos a dizer: 'Madalena, e o leitinho?', 'Bebe o leitinho!', 'Olha o leitinho', com ela a não beber nada quando antes adorava e devorava litradas daquele leite que é caro como tudo.
O passo seguinte, uma vez que não quero que ela vá de estômago vazio para a creche, é sentá-la na cadeira e fazer-lhe um prato de papa. Outro drama mexicano.
Chora, berra, afasta-me as mãos, bate nas mesmas, esfrega-se toda de papa - cara, nariz, cabelos - e eu começo a ficar como uma personagem de um filme do Almodovar, ou seja, à beira de um ataque de nervos.
Respiro fundo, depois de várias insistências contrariadas, decido passar ao plano 'C'.
'Queres queijinho' - pergunto, e logo ela começa a esticar-se toda e a olhar em direcção ao frigorífico - numa ladaínha sôfrega de bebeguês - que, traduzido à letra, é qualquer coisa como, 'dá-me, dá-me, dá-me' e só se cala quando a vontade é satisfeita.
Acedo-lhe o pedido e passo-lhe para as mãos uma fatia de queijo partida em duas e um grande pedaço de pão. Ela sorri de contente.
Petisca-o, estraga mais do que aquilo que come, faz ronha, imensa fita, guincha se a contrario e a apresso e eu torno a olhar o relógio e a ver as horas a passar. São quase dez da manhã e eu em casa. Penso: 'e quando estiver a trabalhar?' e desisto logo de tais preocupações sofridas por antecipação.
Fico ansiosa, começo a irritar-me. 'Aqui quem manda sou eu' - digo-lhe - mas ela não faz caso e volta a troçar de mim.
Sinto-me muitas vezes impotente perante o seu feitio, mas não vergo, o que leva a que, neste momento, nesta fase em que ela se encontra, a nossa relação seja mais baseada em autoritarismo do que manifestações de carinho.
Sinto-me uma déspota, mas digo para mim mesma que tem de ser, senão qualquer dia não faço nada dela, que esta personalidade já lhe vem do berço, está-lhe nos genes e ninguém lhe ensinou tal coisa apesar de eu também não ser flor que se cheire.
Lembro-me da minha mãe e das suas queixas a meu respeito. E respeito-a. Lembro-me de como me dizia: 'um dia que tenhas filhos é que vais saber dar valor' e reconheço-lhe os sentimentos. Também eu era levada da breca.
Depois da tourada do comer, segue-se a tourada do: 'na cozinha só quero mexer no lixo ou andar com o garrafão de 5 litros de água pela mão', ou a tourada do 'caminho até ao carro', ou 'caminho até à creche', ou 'caminho da creche para casa', ou 'caminho da garagem até ao elevador'.
Em quase todos eles, há sempre um momento em que a menina Madalena se atira para o chão, de joelhos, ou estendida ao comprido, onde esperneia e chora como se a estivesse a matar.
Juro que até tenho vergonha quando me cruzo com os vizinhos. Ela guincha tanto ultimamente, que devem pensar que a pobre criança é um saco de pancada nas minhas mãos.
Na creche é igual. É drama para vestir o casaco, é drama para pegá-la ao colo, é drama para a sentar na cadeira do carro, é drama para tudo.
Tenho dias em que, confesso, sinto um alívio enorme quando a deixo na creche e em que fico logo alterada mal a vou buscar.
Quando tenho a ajuda do pai em casa a coisa corre mais ou menos, mas quando está sozinha comigo, gosta de puxar e mexer os meus botões até ao limite.
É por isso que só de pensar no dia de amanhã, até tremo.
Amanhã irei com ela às vacinas dos 15 meses, que serão dadas no braço.
Conhecendo a 'ferinha' como conheço, vai ser um episódio épico semelhante a um circo romano. Muitas lágrimas, sangue, suor e força.
Além de que não vai à creche e ficará comigo o dia todo.
Não sei como é que ainda não tenho um único cabelo branco mas, como os pinto, assim como assim, se aparecem, logo são camuflados, o que me vai dando a falsa ideia de eterna juventude', mesmo que esteja mais perto da loucura do que longe dela.

terça-feira, fevereiro 23, 2010

life

Isto é tão bonito. E tão verdade.

segunda-feira, fevereiro 22, 2010

a poderosa atracção dos homens pelas 'mulheres vulgaris'

Sempre que olho para a senhora acho que algo não bate certo. Sim, a dor de cotovelo é grande, mas sejamos realistas, para além de ser alta, magra, escultural e tonificada, de ter pernas infinitas e de ser italiana - o que é, por si só, sinónimo de mulher bonita - há algo nela que não me agrada (e não é por ser a namorada do George Clooney). Há algo de vulgar que não consigo identificar, algo que me remete, imediatamente, para palcos e cabarés, para varões e biquinis reduzidos, para falta de classe generalizada, mesmo que quando apareça ao lado dele esteja mais perto de uma 'ladie' do que uma louca na cama.... Mas esta foto, esta foto não engana ninguém e veio constatar que realmente o meu 'olho clínico' continua apurado. Geralmente nunca me engano. E tu, Isabella, até podes estar mais modesta e comedida, mais polida e elegante, mas esta pose de 'até-quando-ato-o-meu-sapatinho-sou-boa-e-sexy, -sim, -porque-até-de-biquini-eu-ando-de-sandálias-de-tiras-e-salto-alto', nunca me enganaste.

sexta-feira, fevereiro 19, 2010

fait divers

Hoje, movida por uma qualquer vontade desconhecida e desejo recalcado, decidi arrumar o meu armário. Dar um pouco de ordem ao caos reinante. Dei por mim a deixar a miúda na creche e a enfiar-me sorrateiramente no Continente cá da zona já com a ideia fisgada de comprar cestos, caixinhas e cabides onde arrumar cintos, boinas, echárpes e demais acessórios que proliferam pelos recantos perdidos das prateleiras, ocupando-me espaço e levando-me à loucura quando preciso deles e não os encontro.
Cheguei a casa cheia de ganas de pôr mãos à obra. Hoje era daqueles dias em que se o dinheiro o permitisse tinha remodelado uma série de coisas. Ando há séculos para mandar imprimir umas telas com fotos nossas em tons de sépia e/ou a preto e branco para pôr no nosso quarto, mas acabo sempre por achar que é um pequeno 'luxo' desnecessário, pelo menos nesta altura.
Contentei-me com cestinhos cor-de-rosa, numa espécie de verga plastificada com tampa e um enorme 'botão', a 2€, onde arrumei tudo, dispondo-os ordeiramente e lado a lado. Dobrei camisolas, separei a roupa de verão da de inverno (sim, estava toda junta) e encontrei peças que já não sabia do seu paradeiro faz tempo.
Constatei que deixei morrer praticamente todas as plantas que existiam nesta casa e as que ainda não morreram, encontram-se num estádio decadente de ressuscitação falhada. Estendi roupa e assim que o acabei de fazer caiu uma valente tromba de água. Limpei a cozinha com sonasol verde, esfreguei portas, armários e paredes salpicadas de gordura e sentei-me ao computador a refazer um trabalho pendente que ando há semanas para enviar para uma editora.
Sinto que tive um dia produtivo, porque abro as portas do meu armário e está tudo no seu sítio como acho, nunca antes esteve. Claro que ainda tenho ali uma pilha monstruosa de roupa para passar a ferro - e mais duas máquinas estendidas que brevemente se juntarão a ela - assim como outro armário cheio de sapatos que também merece levar uma valente volta, mas de momento não quero saber.
De momento quero apenas pensar que, por hoje, fui bem sucedida.

quarta-feira, fevereiro 17, 2010

visões

Morro de medo de atropelar um animal.
Mas morro mesmo, porque sei que no dia em que algum cão, gato, ouriço caixeiro ou pássaro se atravessar à minha frente na estrada, eu serei incapaz de o matar e o mais provável é matar-me a mim.
Tenho tanto pavor que às vezes, quando conduzo, tenho receio que algum cão saia do nada para o asfalto e me leve a viver com um peso na consciência. Chego a ter alturas em que até tenho visões com semelhante acontecimento.
Agonizo perante o sofrimento animal. É algo que me perturba a sério.
Um dia destes, vinha no carro com o Carlos, eu sentada no lugar do pendura, quando do meio do nada mandei um valente berro. Ele assustou-se a sério, claro, e deu uma guinada violenta com o carro no sentido da faixa oposta. Por sorte não vinha ninguém. Tudo porque no meio da estrada estava um pombo, metade já esborrachado, metade vivo, esbracejando e lutando contra a morte certa.
Escusado será dizer que o meu marido se fartou de ralhar comigo pelo meio comportamento, que gritos daqueles não se dão, não enquanto se conduz, que podíamos ter tido um acidente por causa de um pombo, que tenho de me controlar, que o pombo da morte já não se livrava. E eu a ouvi-lo e a saber que ele tinha razão em cada palavra que lhe saía da boca para fora, mas a imagem do pombo metade vivo, metade morto não me saía da cabeça e perturbou-me a mente durante, pelo menos, uma semana.
Quando estava grávida da Madalena, para aí de seis ou sete meses, vi um cão largar-se do dono, desatar a correr descontrolado para a estrada, vir um carro e colhê-lo. Vi tudo. Fui a única que vi o animal a ser atropelado, mais ninguém que estava comigo viu o exacto momento em que o carro lhe embateu. Chorei tanto mas tanto, que às tantas já tinha o Carlos, o meu pai e a minha mãe a ralharem comigo por estar tão enervada, que aquilo não fazia nada bem ao bebé, que não me podia enervar daquela maneira, não enquanto estivesse grávida. Pelo meio, lembro-me do meu pai dizer: 'o animal já está bem, está lá o dono a socorrê-lo, o animal está bem', numa tentativa desesperada de me fazer acreditar que aquilo que vira fora 'coisa pouca' e que, como tal, podia parar de chorar, mas a imagem suicida do animal a correr em direcção ao carro voltou a nublar-me.
Hoje, quando vinha da creche da Madalena, numa rotunda, um enorme cão castanho estava parado na mesma. Andava vagarosamente, como se, apesar de quantidade de carros que afrouxavam para não irem em sua direcção, nada lhe importasse. Como vinha devagar desviei-me e segui o meu caminho sem grandes sobressaltos, olhei várias vezes pelo espelho retrovisor para me certificar de que o animal continuava vivo e de boa saúde, mas percebi, assim que passei por ele que aquele cão pura e simplesmente tinha desistido de viver.
E não consigo deixar de pensar naquela visão de quatro patas, cabeça cabisbaixa e olhos mortiços. O mais provável é perseguir-me durante semanas, tal como todos os outros.

terça-feira, fevereiro 16, 2010

mais do mesmo

Não tenho escrito nada. Ando sem vontade, além de sentir não ter nada para dizer.
O curso entretanto já acabou e voltei a estar em casa agarrada ao computador a disparar cv´s e à espera de nem sei bem o quê.
Ando desmotivada e desiludida com uma série de pessoas o que me levou a tomar algumas decisões bem radicais de o demonstrar.
Também ando preocupada e triste, profundamente triste com alguém que me é muito querido e próximo.
A semana passada foi um turbilhão de emoções. Foram notícias más em catadupa e senti um nó no estômago como há muito tempo não tinha.
Depois de um certo período de euforia, ilusório é verdade, eis que bati de novo na realidade: continuo sem nada e sem perspectivas de trabalho. Já fiz de tudo, já me socorri de todos os contactos e logo eu, que odeio pedinchar o que quer que seja.
Fui a uma entrevista para o Ikea de Loures. O processo de recrutamento começou e eu fui chamada, assim como centenas de pessoas, para a primeira fase de selecção. Se passar a tudo, irei, muito provavelmente, para atendimento em loja ou outra coisa do género e a ganhar miseravelmente a tempo inteiro ou em part-time. Neste momento é a minha única hipótese. Ou isso, ou um call center, mas não posso ficar sem ganhar um cêntimo a partir de finais de Março.
Não sei porquê, mas meti na cabeça de que ia ser a seleccionada para aquela entrevista da treta a que fui há umas semanas. Estava tão confiante de que ia ficar que até já sentia a coisa como minha, e andava convencida de que tinha tido, finalmente, a oportunidade que estava à espera de voltar ao mercado de trabalho como jornalista e a escrever sobre o que eu queria. Não consegui. Na 5ª feira, quando recebi a notícia todo o meu mundo desabou. Chorei como uma criança.
Neste momento tenho uma grande falta de confiança nas minhas capacidades. Sinto que já estou há tanto tempo afastada do mercado de trabalho e dedicada à maternidade que é apenas isso que me define e que, como tal, não aparento credibilidade, ou pelo menos o suficiente para acharem que eu posso ser uma boa escolha.
Sinceramente, acho que é isso.
E constatá-lo dói-me imenso. Acho que não passo de uma mãe que escreve umas coisas mas sem grande estilo definido, sem grande qualidade e cada vez mais longe de conseguir alcançar realmente aquilo que almeja.
No sábado à noite fui convidada para ir ao jantar de aniversário de uma ex-colega do curso de formação de formadores que andei a tirar em Novembro e deparei-me com uma soirée elegantíssima, cheia de gente super bem colocada na vida e com um status profissional e pessoal muito... chamemos-lhe, 'agradável'. Sinto-me sempre um peixe fora de água nestas circunstâncias, mas tentei aparentar um ar 'normal' e confortável. A Maria, a anfitriã da festa, apresentou-me a todos como 'a minha amiga Mafalda, distintíssima jornalista' e eu senti-me a corar por dentro com semelhante mentira. Sei que ela não faz por mal, antes pelo contrário, mas se há coisa que não me sinto é 'distintíssima' no que quer que seja, mas mais 'indefinida'.
Outra coisa que me tem feito pensar é no facto de todas as mães que, tal como eu, durante a minha gravidez e primeiro ano de vida da Madalena se encontravam desempregadas, já estar tudo a trabalhar ou terem arranjado trabalho recentemente. Fico sempre feliz quando sei que alguém que estava desempregado consegue emprego, mas também penso sempre: 'para quando eu?', 'quando chega a minha vez de celebrar?'.
Parece-me cada vez mais distante. Mais difícil.
Sempre acreditei na máxima de que as coisas acontecem por uma razão, mesmo que na altura não entendamos porquê e quero continuar a acreditar nela, apesar de me custar cada vez mais este tipo de frases feitas que servem de consolo aos tristes.
Como dizia a minha mãe hoje: 'vais ver que tens algo de bom à tua espera, algo te está reservado'.
Até pode ser, mas eu já não consigo acreditar muito nisso. Acho que se realmente algo me está reservado, está a fazer-me penar até à última e duvido muito, mas duvido mesmo, que apareça assim do nada, quando falta tão pouco tempo para eu ficar com a corda ao pescoço.
Acho que se aparecer alguma coisa não é porque me está destinado, é por pura necessidade.

quinta-feira, fevereiro 11, 2010

"when you try your best but you don´t succed"

E ao fim de duas semanas veio a resposta.

Negativa.

E com ela se foi a pouca auto-estima residente e a esperança de começar a trabalhar no início de Março.

sexta-feira, fevereiro 05, 2010

lhasa de sela





Só me apetece ouvir isto over, and over, and over again...
É tão bom, tão deliciosamente triste, tão bonito, tão tudo aquilo que sinto cá dentro e não consigo exprimir.
A mortalidade, a minha, a dos meus, a dos que me são queridos, a do mundo em geral, tem-me tomado de assalto o pensamento nestes dois últimos dias e sinto um nó apertado dentro do peito.
Só me apetece ouvir Lhasa de Sela.
Mas também ela já morreu.

fantasmas


O Jacinto Lucas Pires apareceu no curso que ando a frequentar para nos dar uma parte da formação.

Até aqui tudo bem.

Quando o vi, reconheci-lhe as feições, mas não soube logo dizer de onde aquele rosto me era familiar.

Quando pediu que nos apresentássemos fê-lo de uma forma muito descontraída, brincando com o assunto e dizendo que quem quisesse fazer o pino que o podia fazer, que aquelas iriam ser as apresentações mais divertidas de sempre, deixando-nos logo à vontade e na expectativa do que estava para vir.

Imbuída pelo espírito presente na sala, a Marta tirou do bolso um vermelho nariz de palhaço e colocou-o no seu, encarou-o de frente e disse:

- Chamo-me Marta e quero ser palhaça.

A expressão dele ficou difusa, perdeu o sorriso e no seu rosto podia ler-.se um enorme ponto de interrogação.

- Queres ser palhaça? Perguntou ainda hesitante.

- Quero, respondeu a Marta entre risos nervosos, levando-nos a todos a dar risos nervosos perante o desconforto evidente.

- Mas sabes que a condição essencial para se ser palhaço é não rir, não sabes?

- Acho que sim - e continuava a rir, sem conseguir articular um discurso muito coerente, numa forma quase inconsciente de que tinha ido longe demais.

- Houve uma altura da minha vida em que me senti um palhaço, retorquiu o Jacinto.


E pronto, percebi ali, preto no branco, que todo o escritor (e artista), vive a maior parte do tempo confrontado com os seus próprios fantasmas.

terça-feira, fevereiro 02, 2010

birras

A minha filha entrou, oficialmente, naquela idade-fase em que qualquer pai e mãe estremece só de pensar: a das birras.
Hoje, quando cheguei à creche ao final da tarde e lhe vestia o casaco, depois de alguns mimos muito queridos e fofos que me encheram o coração de ternura, a minha pequena filha passou da imagem angelical de criança modelo, para se transformar, rapidamente, numa amostra júnior do Godzilla, fazendo um berreiro tal - acompanhado de batidas furiosas de pé no chão e chapadas nas minhas mãos - que levou a que todas as educadoras e auxiliares saissem das salas e viessem até ao corredor ver o que se passava com a 'pobre da criancinha'. Tudo porque não a deixei mexer num livro que era de outro menino.
Se tivesse um buraco tinha-me enfiado.
É incrível como me senti coagida por um ser tão pequeno.