quinta-feira, outubro 24, 2013

Eu sou daquelas pessoas que gosta de chuva, mas sempre que há cargas de água fortes e contínuas, fico angustiada. Primeiro porque moro num prédio a cair de podre, como tantos outros de Lisboa, mas que com o passar do tempo e dos anos, da falta de condomínio e de manutenção, está cada vez pior, cada, cada, vez pior… segundo, porque sou a que estou mais perto do telhado, o que significa que sempre que há chuvadas fortes, eu tenho problemas em casa. Ontem, quando saí do trabalho e assim que cheguei a casa, a minha preocupação foi logo ir a correr ver se estava tudo bem. Não estava. Na sala, junto à janela e perto de um nicho onde existem umas prateleiras embutidas, quando há chuvadas muito fortes, escorre água – ou de duas rachas que já lá se encontram instaladas, ou directamente do aplique da luz - e aí sim, fico em pânico. Depois da forte chuvada do final do dia, a parede acusava o excesso do peso da água que caiu e por ela abaixo escorriam várias estradas. Corri ao quarto que, por ser em água furtada e ter janela velux sempre me faz ter o coração nas mãos, mas não havia sinais de infiltrações e estava tudo bem, sosseguei. Na cozinha, junto à janela que há dois anos me deu das maiores aflições da minha vida – com água a cair como se estivesse na rua – também estava tudo bem. Fiquei mais calma. Rezei para dentro e pedi muito para a chuva parar e o meu coração sossegar. “Não posso ser tão negativa” – pensei - “Não posso ser tão negativa”. Fiz o jantar, dei banho à miúda e, quando estávamos a terminar a refeição, entre o som que vinha da televisão e a conversa banal à mesa, um ruído insistia em dar sinal e prendia-me a atenção. Da cozinha caia um “ping-ping” que se torna cada vez mais familiar e que os meus ouvidos de tísica detectaram. De um aplique de luz - tenho tecto falso com apliques de luz embutidos em toda a casa - caía água em direcção ao chão, em pingos cada vez mais ritmados.
Há dois anos tive este problema com as primeiras chuvas de Outono. Tive de contratar uma pessoa para vir limpar os algerozes e ver o que podia ser feito. Tirou lixo, levantou algumas telhas e pouco mais. Cobrou-me perto de 200 euros e “Tchau aí”. A coisa ficou resolvida durante uns tempos - pelo menos na cozinha não houve mais problemas – até ontem. No dia anterior a minha mãe, qual bruxa, dizia-me: “Tu vê lá que esses algerozes devem estar a precisar de serem limpos” e eu, muito secamente, respondi, “Foram limpos há dois anos, levaram-me 200 euros para o fazer, tenho lá 200 euros para mandar limpar algerozes outra vez. Estou farta de gastar dinheiro”, pondo fim à conversa. No dia seguinte acontece-me isto.
Depois de uma noite em que a chuva continuou a não dar tréguas, hoje de manhã cheguei à cozinha e estava tudo seco, os pingos tinham parado. Na sala também não havia sinais de água a escorrer pelas paredes. Agradeci a algo ou alguém que tenha escutado as minhas preces e apesar do dia cinzento lá fora, acreditei que o pior já tinha passado.
Mas agora que cheguei ao trabalho, continuo aqui de coração apertado, a sentir-me insegura e indefesa perante algo que não consigo controlar e do qual não sei o que fazer, principalmente quando vejo que lá fora cai outro dilúvio e não sei em que estado encontrarei a minha casa quando lá chegar.
Odeio viver em casas velhas. Odeio. Sinto-me tão indefesa e insegura nesta casa que até tenho o sonho recorrente de que o chão está prestes a partir, então ando muito devagarinho com medo de o meu peso fazer cair as poucas tábuas de madeira que ainda nos sustêm e digo à minha filha para não correr nem saltar, porque podemos cair no andar de baixo. Acordo sempre angustiada quando este sonho me assalta a mente durante a noite.
Sinto que esta casa vai ser a pedra no sapato da minha vida. O prédio não tem condomínio nem nunca teve, as poucas pessoas que nele vivem não estão nem aí para o assunto. Pago um empréstimo ao banco que me leva metade do meu ordenado e que me deixa, literalmente, com a corda ao pescoço todos os meses. O sacrifício que faço para conseguir continuar a cumprir com a dívida que contraí para a vida, não é proporcional à falta de segurança ou de condições que tenho. Se arrependimento matasse, este seria sem dúvida o grande arrependimento da minha vida, o dia em que decidi comprá-la, num gesto impulsivo de imaturidade e emancipação. Divorciei-me e fiquei com este legado nas mãos. Demasiado caro e velho para ter um final feliz à vista. Vender? É uma hipótese, mas a casa já esteve à venda há uns anos e ninguém lhe pegou. A solução na altura passou pelo arrendamento, mas quando me divorciei, por coincidência ou não, o inquilino comunicou que queria sair e para mim, naquele momento, voltar a esta casa era a solução mais acertada. Afinal era minha e para quê ir meter-me noutra se tinha de continuar a pagar esta? Fazer obras? Era bom, mas não tenho dinheiro. Continuar ali? Que remédio. Até quando? Não sei, mas por mim saía já hoje.
Vou continuar a rezar baixinho e a pedir que a chuva pare.

2 comentários:

Pekala disse...

da-se,ninguém merece :(

mm disse...

Também vivo numa casa velha e a chuva para mim também é uma angústia, porque vivo igualmente no último andar. Limpar os próprios algerozes não é assim tão difícil e é uma boa forma de poupar 200€. Eu antes das chuvadas estive a pôr silicone novo em todas as janelas. É o que faço anualmente lá para o fim de outubro, e agora, nesta pequena pausa com sol, vou melhorar os sítios onde ainda entra alguma água. Moro nesta casa há três anos, todos os anos entra menos água. Acredito que um destes invernos não há de entrar nenhuma. Concluindo, experimenta arranjar tu própria. Boa sorte!