quinta-feira, novembro 29, 2007

Contos II


















Subindo a ladeira íngreme, Maria deixava antever o tornozelo bem delineado. A cada passo e debaixo daquela saia grande e pesada, o vislumbre da pele branca e alva como marfim, deixava todos os homens que a seguiam ardentes de desejo. Era época da apanha da fruta e Maria, de grandes olhos cor de avelã e cabelo preto como carvão, sabia o impacto que provocava na líbido do sexo oposto. A rapariga era desenvolta, alta como nenhuma outra mulher das redondezas.
Maria assustava pelo seu porte altivo e bem constituído. Tinha apenas 18 anos, mas comparada com as restantes raparigas, já aparentava muitos mais. Talvez por isso, fosse fonte de desejo e de respeito. Na altura da apanha da fruta, lá ia a Maria, de saia pesada a tapar-lhe as formas, de cesta encaixada na anca e amparada pelo braço, deixando a outra mão livre para chegar aos ramos mais altos. E se ajudava a altura. Ninguém lhe batia na apanha da fruta, nem mesmo os homens, que embevecidos pela beleza da jovem, lhe gabavam o tamanho para lhe alimentar o ego. Os mais atrevidos traziam-lhe um pedaço de broa de milho à hora da refeição, perguntavam-lhe se queria um copo de vinho, que ajudava à bucha. Os outros, pequenos e tímidos, afastavam-se dela. Não que a sua beleza lhes fosse indiferente, mas enfezados e tacanhos, sentiam-se diminuídos no seu orgulho masculino por nem aos ombros lhe chegarem. E Maria lá andava, entre as maçãs e as pêras que rebentavam de orgulho e madurez no alto das árvores, a sua saia rodada, pesada e comprida, deixando vislumbrar o tornozelo elegante e a pele clara e intocável. E todos a consumiam com os olhos.
Certo dia, estava a Maria pendurada no escadote, com a cesta de verga encaixada na anca e cheia de maçãs até acima, o corpo debruçado para a frente, o braço esticado ao máximo, quando a escada de madeira na qual permanecia de pé, cedeu. Voaram maçãs pelos ares, caindo e rebolando longos metros pelo pomar, a cesta de verga - que já acusava o passar do tempo - desfez-se em pedaços, apodrecida pelo peso da fruta, ano após ano. A saia da Maria levantou-se até aos joelhos, mostrando as pernas esguias tapadas pelo tecido sufocante. E a Maria caiu redonda no chão, fazendo um ruído forte e seco que despertou todas as atenções.
Todos os homens do pomar acorreram a ajudá-la, mas quando chegaram à beira da alta Maria, já a mesma se tinha levantado e, divertida com o episódio, apanhava as maçãs do pomar, colocando-as na saia que lhe substituía a cesta e se encontrava agora, levantada até aos joelhos.


in a bad mood



















Confesso que hoje estou de mau humor. Sinto-me saturada, farta. Farta de aturar gente sem o mínimo de consideração pelo trabalho feito, pelos outros. Farta de ver abusos de autoridade, do compadrio, da injustiça, de serem sempre os mesmos a darem-se bem e os mesmos a serem prejudicados. Farta de trabalhar e de nunca conseguir fazer aquilo que realmente gosto. Farta de ganhar mal e de andar a contar trocos até ao final do mês. Farta de idealizar, desejar, sonhar e de não conseguir fazer nada que altere o rumo dos acontecimentos. Farta de não poder mudar o destino, o rumo das coisas, de pôr uma luz mais incidente e luminosa sobre mim, para me orientar, mostrar o caminho. Farta de me sentir perdida, incompreendida. Farta de lutar. Farta de remar contra a maré. Farta, muito farta.
Chego a esta altura do ano e sinto sempre uma angústia latente, crescente.
Talvez porque olho para trás e vejo que afinal, as esperanças vãs do início do ano, morreram todas e afinal, este que passou, além de não ter trazido nada de bom, só serviu para me deixar ainda mais revoltada.
Sinto uma raiva e uma revolta muito grande dentro do peito. Sei que não é bom deixar-me invadir por tais sentimentos, mas não ando a conseguir evitá-los. Nunca fui uma pessoa paciente, serena ou calma. A espera desespera-me, deixa-me exasperada. Deixar as coisas nas mãos do destino é o meu pouco e único consolo, onde as mágoas e as angústias encontram leito e dormem acreditando ainda na possibilidade de que afinal, esta história, consiga ter um final feliz.

domingo, novembro 25, 2007

vírus



















Tenho andado com uma gripe ‘daquelas’. Já ando assim há mais de uma semana. Tenho dias em que me sinto melhor, mas logo vêm outros em que parece que vou cuspir os brônquios com uma tosse que não me larga. O fds lá em cima na terra também não ajudou. Apesar de a temperatura exterior até ter estado mais ou menos amena, a casa dos meus sogros estava gelada como um corpo sem vida. Nem parece deles, mas desta vez, não ligaram o aquecimento durante o dia e só o fizeram à noitinha, não dando tempo suficiente da casa aquecer. Andei o dia todo com as extremidades geladas, enrolada no cachecol e com o gorro na cabeça. A noite foi infernal, com uma tosse contínua que começou por volta da uma da manhã e só acalmou às cinco com uma caneca de chá quente com mel, que me aliviou a garganta e o espírito até às oito e meia, altura em que voltei a tossir novamente que nem uma louca e já não consegui voltar a adormecer. Só melhorei quando cheguei a casa no domingo à noite, com o aquecimento central ligado e a lareira acessa. No entanto, hoje, sinto que piorei. Sinto-me fraca, sem forças no corpo, dorida, a cabeça a latejar… se não fosse a quantidade de trabalho que tenho para despachar, ia mas era para casa e enfiáva-me na cama.
Ontem tive uma resposta a algo que já tinha perdido as esperanças de chegar: a resposta do Hospital da Estefânia à carta que escrevi a fazer queixa da médica que me seguia no serviço de genética. Confesso que assim que abri a caixa do correio e vi uma carta do Ministério da Saúde, vi logo do que se tratava, mas fiquei com as pernas a tremer a pensar se não viria para aí um inquérito, ou até mesmo, um processo. Afinal, os meus medos não tinha razão de ser. Basicamente o hospital tomou completamente o partido da sua ‘profissional’, ignorando as minhas queixas ao seu serviço e alegando o meu ‘transtorno emocional’ no que diz respeito a esta matéria. Confesso que a carta me deu vontade de rir. Ao início quando a li pensei: 'Ok, pronto, cumpri o meu papel e o assunto morreu aqui’, mas depois, numa segunda leitura mais atenta, verifiquei que a última frase alegava que se eu quisesse, metiam outro profissional a tratar do meu processo. Foi aí que se fez luz na minha mente. O resultado da minha biópsia será conhecido na próxima segunda-feira, a partir daí e consoante o resultado, escreverei nova carta de resposta e exigirei nova recolha de sangue para repetir o teste de ADN, assim como a entrega do meu processo a novo médico do serviço de genética, porque com esta senhora, não quero mais nada. Pode ser que afinal, a minha carta de queixa até tenha sido benéfica… até porque eu acredito no encadeamento lógico das coisas, nas coincidências, na intervenção do destino, em algo que me permita continuar a agarrar-me, mesmo não tendo nada de palpável.
Digo para mim mesma repetidas vezes: ‘Tens de ter calma. Tudo se resolverá.’
O difícil é convencer-me disso.

castanheiro


















A castanha é um fruto bojudo, roliço. Se fosse uma pessoa, seria considerada gorda, atarracada, anafada. Tem uma casca dura e uma textura grossa, coberta por uma fina pele macia, felpuda, que se entranha dentro das unhas e se parte em lascas quando está mal assada. O seu corpo é farinhento, consistente, doce. Faz-nos inchar como um balão, mas sacia a gula e aquece as mãos. Não é de estranhar pois, que semelhante riqueza esteja bem protegida, dentro do seu casulo coberto de picos e tradicionalmente denominado por 'ouriço'. Havia às centenas na Gestosa, afiados como agulhas, deixados ao desbarato para todos aqueles que se atrevam a quebrar as barreiras do tempo e do isolamento e, movidos pela curiosidade citadina (como nós), se aventurassem a apanhar as que restavam no chão, soltas como despojos, brilhando entre folhas de tons outonais. Naquele pequeno terreno que nem nos pertencia, encobertos pelas folhas de um castanheiro centenário, de tronco sólido e consistente, sentíamos a magia das histórias dos contos de fadas. O bosque encantado da minha infância era ali, com um ribeiro que na Primavera corre cheio de força, mas que na minha estação do ano favorita - o Outono - se encontra seco, coberto de um manto de folhas soltas que ondulam a cada passo, denunciando com um som seco e estaladiço os nossos movimentos. Os ouriços de castanhas encontram-se espalhados pelo chão até onde os nossos olhos conseguem alcançar. Misturam-se com as cores do momento, que quase se confundem com a cor de bronze velho das minhas botas, tão modernas, tão citadinas e tão desadequadas para aquele lugar.

sexta-feira, novembro 23, 2007

Contos I



















Ela sabia, no mais íntimo do seu ser, que ia conseguir. Era um longo caminho tortuoso, cheio de cascalho, que a fazia derrapar e esfolar os joelhos. Mas ela levantáva-se. Sempre. E prosseguia, com a certeza de que nada nem ninguém a poderia demover do contrário. Um dia, cansada pelo calor e inchaço dos pés, sentou-se na beirinha de uma pedra que lhe pareceu cómoda. Deixou-se ali ficar, dormente pelo sol que lhe cobria o rosto e a tapava, como um cobertor faz a um corpo frio, enquanto tombou lentamente a cabeça para trás e fechou os olhos. Nos seu cabelos, a brisa da serra tocava de fininho, fazendo-os ondular suavemente, como se de fios de ouro se tratassem, espreitando entre o lenço de chita que lhe emoldurava o rosto cansado. As mãos entrelaçadas apertaram-se. Contraiu-as no peito, evitando que toda a sua temperatura evaporasse. Lembrou-se da mãe e da sua voz doce quando a embalava à noitinha. Era tão pequena nessa altura. Mas a voz da mãe aparecia-lhe nítida, cristalina, como se estivesse junto dela naquele instante, a cantar-lhe ao ouvido. Ajeitou o xaile que trazia sobre os ombros. Tinha-o tricotado nos tempos livres, quando a lavoura e os animais o permitiam. Tudo isso consome muito tempo na vida de uma mulher. Expressou um sorriso, calmo e tranquilo. Queria adormecer com aquele conforto na alma. Sabia que não ia sair daquela rocha fria e dura tão cedo. As pernas tinham fraquejado pelo caminho e pediam benesses. O sol ameno que ainda à instantes a embalava, rapidamente deu lugar a uma chuva miudinha que rapidamente se tornou desconfortável. Pareciam bicos de facas que se cravavam na pele, recordando-a a cada gota, do quanto era frágil. No alto daquela serra, sentada naquela rocha, o caminho de cascalho pareceu-lhe muito longo para ser percorrido por uma velha cansada. Pensou desistir, contraiu as mãos mais uma vez, apertou o lenço que trazia na cabeça fazendo com que o mesmo lhe tapasse as orelhas, ajeitou o xaile de lã, obrigou as pernas a obedecer e sem demoras, voltou a pôr-se a caminho.

quinta-feira, novembro 22, 2007

one of best thing´s in life


















Ontem combinámos encontrar-nos ao final do dia para matar saudades. De vez em quando fazemos isso. Actualmente cada vez menos, é certo, porque temos horários distintos, porque uns saem tarde do trabalho, porque outros são freelancers e não têm tempo… mas o local onde o fazemos é o mesmo desde há anos – há onze para ser mais precisa – por isso, basta mandar um sms a dizer: ‘encontro às sete no sítio do costume’, que todos sabem onde ir ter. Fui das primeiras a chegar, aos poucos o grupo foi-se compondo. Como o nosso local de culto é o bar irlandês O´Gillins na rua dos Remolares do Cais do Sodré, é normal de vez em quando, estar cheio de ingleses barulhentos. Ontem, dia de jogo decisivo de apuramento da Inglaterra, estava a abarrotar e para falar tínhamos de estar aos gritos. Desistimos ao fim de hora e meia. Ainda deu tempo para beber um chá de limão e comer uma das deliciosas sandes de atum, mas achámos melhor ir para um sítio mais sossegado. A L. sugeriu irmos até à sua casa nova jantar e nós gostámos da ideia. Quando saímos do bar chovia a potes. Eu que tenho andado adoentada, com gripe e com dores de garganta, era o cenário perfeito para ficar ainda pior. Uma corrida rápida até ao carro e toca de ir até à Penha de França a guiar devagarinho e debaixo de chuva forte. Chegámos todos ao mesmo tempo e assentámos arraiais na sala, ainda semi-nua e cheia de caixotes por todo o lado, a ver o triste resultado do jogo de Portugal. Entretanto improvisámos o jantar com aquilo que havia na cozinha – carne assada e ovos – fizemos arroz branco, uma salada e ainda terminámos com café e bolinhos de manteiga, os cinco, numa mesa para quatro, sentados em caixotes de papelão e cadeiras de plástico do Ikea. Voltámos a ver fotografias de há dez anos atrás. Eu extremamente magra, na praia de Porto Côvo, com um lenço azul escuro na cabeça e um pareo a condizer (já muito coquete e muito fashion victim para a altura), ou a R., com o seu corte de cabelo à Rosa Mota (onde é que ela estava com a cabeça para fazer aquilo?), comigo, dentro da tenda do parque de campismo também de Porto Côvo. A H., na Expo 98, muito mais gorda (aliás, foi a única que emagreceu com a idade), que ontem, ao ver-se naquelas imagens quase que ficava incrédula perante a sua figura e o seu cabelo muito afro, muito volumoso! O R. mais gordo, de pele muito branca, dentro da cachoeira de água natural em Alpalhão, ou eu e a L., em Serra Nevada, onde vi neve pela primeira vez na vida e onde tirámos fotos tal e qual um casal de apaixonados em lua de mel.
Lemos ainda postais que costumávamos escrever quando alguém fazia anos – hábito que infelizmente perdemos. Rimos às gargalhadas com aquilo que dissemos. Rimos, rimos e rimos. Hábito saudável que se deve fazer sempre, principalmente quando estamos com as pessoas que gostamos e com as quais temos tanta história em conjunto para partilhar. E se ontem andei muito revoltada, muito amarga, muito caústica durante o meu dia, à noite relaxei e senti-me leve, bem, feliz.
Precisava de sentir-me assim mais vezes.

PS – É impressão minha ou os meus posts andam a tornar-se lamechas e saudodistas?

sexta-feira, novembro 16, 2007

mais do mesmo...



















Ontem era dia de tratamento ao cólo do útero na Cuf Descobertas. Digo 'era' porque não chegou a acontecer. Realmente eu só não adivinho a sorte grande porque o destino assim não o permite, porque esta minha intuição quase de bruxa nunca falha. Andei o dia todo a prever este desfeixo. Que iria chegar lá e que ela não me ia tratar, não só porque sabia que estava já no meu período fértil, como ela tinha dito imperiosamente, de que se não estivesse no meu oitavo dia 'pós-menstruação' nada feito. E pronto, nada feito mesmo. Ainda me chegou a ver, mas depois virou-se para mim, com as minhas entranhas expostas num ecrã semelhante a um televisor e disse: 'A menina está cheia de corrimento. Não lhe posso fazer o tratamento' e pronto, eu vi logo o que me esperava. Deitada na marquesa e com a cara virada de lado para não ver o fatal 'televisor', a médica insistia para que eu olhasse. Disse-lhe, 'Desculpe, mas prefiro não ver' e pelos vistos, melindrei-a, porque soltou um 'Era apenas para que visse como está por dentro'. Perante este comentário lá virei a cara em direcção ao dito ecrã e como pessoa impressionável que sou, tive uma visão dantesca de mim mesma. O que me fez constatar que nunca teria futuro na medicina...No entanto nem tudo foi mau. Regresso já na próxima menstruação - o que pelas minhas contas não deve tardar mais do que duas semanas e fizeram-me já uma coposcopia para análise. Também não tardo a receber o resultado da biópsia à pele - é já dia 3 de Dezembro. Ontem como estava na Cuf, ainda fiz o choradinho para me tirarem os pontos que me ficaram na dobra do joelho de quando fui ao Curry Cabral. Lá consegui. A enfermeira, uma miúda nova e simpática, reconheceu-me da última vez que lá tinha ido à consulta de ginecologia - quem me vê as pernas nunca se esquece - e tirou-me os pontos sem sequer me cobrar um tostão. No final ainda passei pela farmácia para levantar os medicamentos e 'bisnagas' que terei de fazer nos próximos sete dias...

Se eu me vejo livre deste ano até julgo que é mentira... que venha outro e depressa, para eu ter novas esperanças e mais 12 meses para acreditar que algo dá certo comigo.




domingo, novembro 11, 2007

Dreams in Colours


Ando apaixonada, enfeitiçada, viciada, no álbum 'Dreams in Colours' do David Fonseca.
Nas últimas semanas o meu leitor de cd, rádio do carro, Itunes e Ipod não tem tocado outra coisa...

E será possível que eu não encontre nem uma única imagem em toda a blogosfera e arredores, da capa do álbum, que possa colocar na minha rubrica 'o que oiço'?! humm? :-(

vivências


















Mais um fim-de-semana que passou rápido demais. Este teve o sabor de uma noite de sexta-feira entre amigos e da dor de barriga que provoca o riso contínuo. Estava mesmo precisada de boas energias e a inauguração da casa da L., com todos deitados no seu colchão insuflável em plena sala, enquanto ouvíamos a banda sonora do Kill Bill II e víamos fotos nossas de há dez anos atrás, foi o pretexto perfeito para me animar o espírito. É incrível como a amizade deste grupo se mantém ano após ano, uma vez que somos todos pessoas tão diferentes. É incrível como ao vermos uma simples imagem do passado, recordamos em conjunto esses momentos, nos rimos deles, relembramos aquela discussão em plena rua, ou a rapidez com que fazíamos as pazes logo de seguida, os dias de faculdade em plena rua da Junqueira, os pastéis de Belém, as exposições no CCB, ou os meses que vivemos em Sevilha, o andar de patins à beira do Guadalquivir, os fins de ano em Porto Côvo... É incrível como ao longo destes anos, mais pessoas se juntaram a este grupo, adaptando-se a ele, como se lhe tivessem pertencido a vida inteira. O grupo também tem momentos de tensão, como todas as relações sociais. Há alturas de repulsa, de incompreensão, de afastamento. Há atracções e omissões, há amores e desamores, mas no fim somos como uma grande família que gosta de se juntar em determinadas alturas e partilhar momentos em conjunto. Este grupo de pessoas faz parte da minha história e sem eles, eu seria certamente, uma pessoa bastante mais pobre. O incrível no meio disto tudo, é a forma como o C. apareceu na minha vida e se adaptou a este grupo de pessoas que já me conhecia do avesso, os conquistou e se enturmou. Hoje, que aqui está, parece que sempre fez parte deles. Só as fotos que vimos em papel provam o contrário.

quarta-feira, novembro 07, 2007

desensofrida


















Ela olhou-o demoradamente, como se naqueles segundos revivesse todas as recordações de ambos. Fixou-o. Naquele olhar via-se a si própria, sozinha, angustiada. Continha nos olhos o segredo que trazia no peito, a imensidão daquela incerteza, mas conteve-se. Não queria nem pensar nela. Bastava sabê-la ali, comprimida e apertada para senti-la. A dor. A dor de saber, ao fim de todos aqueles anos, que tudo aquilo que tinha desejado, que tantas vezes idealizou, estava ali diante dela, motivo do seu sofrimento.
Num olhar, apenas num olhar, conseguia ver claramente todos os motivos, todas as ansiedades, todos os sofrimentos, todos os sonhos. Desfeitos, quebrados, partidos, arrumados e encaixotados em pequenos compartimentos do seu coração. Devidamente etiquetados, catalogados. Sempre que necessitava encarregava-se de abrir a caixa e deixá-los voar livremente pela sua mente, assombrando-a. Como agora.
Valeria a pena? Ela não sabia, mas achava que assim. Deixando-os correr livremente, sabendo-os ali, presentes e despertos, seria mais fácil lidar com eles. Era como se fossem família. Já os conhecia. Não a assustavam. Assim próximos e a sentir-lhes quase o gosto, fariam com que um dia mais tarde, caso algum desses sentimentos se tornasse real, ela já soubesse qual é a sua melodia.
E assim, num olhar, enquanto o olhava, enquanto pensava em tudo o que já tinham feitos juntos, em tudo aquilo em que ele se transformara, em que ela se transformara, em tudo aquilo que ainda lhes faltava viver e que ela não sabia se ainda teriam tempo para isso, em tudo, e apenas num simples olhar, ela revia todos esses sentimentos guardados no seu coração, sentindo o sabor agridoce de cada um. E o coração apertava contra o peito, comprimindo-se e expandindo-se, como se aquele lugar fosse demasiado pequeno e demasiado apertado para estar ali, fechado, prestes a explodir. E ela fechava os olhos, baixava a cabeça e voltava a guardar o sentimento dentro da caixa etiquetada que existia algures no seu coração.


volver III


















'Eu ando pelo mundo prestando atenção a cores que eu não sei o nome. Cores de Almodovar, Cores de Frida Kahlo, cores'...
Se há coisa que me fascina nos países latinos, são as fantásticas cores que se encontram nos mais inesperados recantos, ou na forma romântica como nos cruzamos inesperadamente com flores viçosas e ardentes que compõem as mais belas molduras. Já em Barcelona a sensação foi igual. Só em Lisboa é que não encontro semelhantes momentos. Ou serei eu que não ando de olhos tão atentos ao universo em meu redor?
Uma mostra das fotos madrilenas, aqui.

volver II



















Já aqui falei, se bem me lembro, nesta minha relação quase 'apasionata' com as artes, nomeadamente com a pintura. É algo que não me lembro de ter presente desde sempre, mas que assim que descobri, brotou em mim como uma paixão intensa. Paixão essa que permanece até hoje e que continua intensa e viva, ofegante e em pleno crescimento. A Paula Rego é neste momento o meu amor mais fervoroso. Descobrir o seu mundo, que conhecia de forma tão insipiente e quase negligente, foi uma verdadeira surpresa que foi aumentando de prazer à medida que se revelava às camadas, tal e qual um mil folhas, que nos deixa os lábios gordurosos e as pontas dos dedos coladas pelo açúcar.
Estar ali, quase senti-la, entrar no seu mundo, foi recriminar-me por não me ter lembrado de algo semelhante antes. Foi invejá-la pela genialidade - sim, porque eu invejo muitas vezes quem tem boas ideias - foi reclamar pormenores dos seus quadros como meus, foi entrar-lhe na alma, no coração, no dela, no meu, no de tantos outros.
Tenho uma grande amiga que é verdadeiramente fã de Paula Rego. Tanto, que nestes últimos dias, enquanto partilhava com elas as emoções que os seus quadros me tinham provocado, ela revela-me como sentia um ligeiro aperto no peito de cada vez que falávamos neles e que não é pessoa a quem isso aconteça facilmente. Confesso que enquanto estava ali, naquela enorme sala perante centenas de obras, foi como se visse o seu interior retratado. Foi como se as histórias que tantas vezes partilhamos e que só nós duas verdadeiramente entendemos, tivessem ganho forma e estivessem bem diante dos meus olhos, dos olhos dos outros, expostas e nuas a pedirem que terceiros também as entendam e as levem no peito para casa.
Eu trouxe todas dentro do meu e ainda há cá mais espaço para outras tantas.

terça-feira, novembro 06, 2007

volver


















Aproveitámos o feriado para passear e regressar à terra/cidade que cruzou os nossos destinos: Madrid. Após dois anos de ausência, achámos que esta era a altura perfeita para nos metermos novamente no carro e percorrer os mais de 600 kms que separam as duas capitais. Foi algo sem grande premeditação, foi uma espécie de desejo, uma vontade de partir. 'Vamos até Madrid? Vamos,' e fomos.
Arrancámos sem hostal marcado, depois de um telefonema onde nos informaram que afinal, a reserva feita há mais de uma semana, tinha ficado sem efeito por causa de um eventual engano no livro de registo. Não me preocupou. 'Partimos à aventura', pensei, sem remorsos e como se fossemos dois adolescentes... e assim foi. Tudo muito simples, porque para complicado já basta o dia-a-dia. Aproveitámos as magníficas paisagens serenas do Alentejo e maravilhámo-nos com a imensidão e qualidade do asfalto espanhol sem uma única portagem no horizonte. Parámos as vezes que achámos necessárias, munimo-nos de cds que queríamos ouvir e fomos, calmamente e enquanto as horas da viagem nos permitiram, recordando episódios antigos de quando o C. ia lá ver-me todos os 15 dias, ou da cafetaria Zahara em plena Gran Via, local onde nos conhecemos.
O motivo da nossa viagem não foi apenas romântico ou até, nostálgico. Confesso que a intenção foi mesmo cultural. O motivo? Ver a exposição da pintora Paula Rego presente no Museu Rainha Sofia. E confesso que se as expectativas eram grandes, foram enormemente superadas. Venho fascinada com o que vi. Como se aquilo que estava ali, diante de mim, numa simples tela, me fosse tão intrínsecamente familiar. Como se 600 kms fossem realmente uma distância pequena perante aquele grandioso momento.
Tirando o ponto alto da nossa viagem, que foi ver 50 anos de obra da pintora, Madrid não surtiu os encantos de outrora. Não sei se é por já conhecer a cidade bem demais, por já não me trazer nada de novo, ou simplesmente por não estar preparada para a quantidade louca de pessoas na rua, senti-me quase claustrofóbica, como se já não pertencesse ali. Talvez tenha sido mesmo uma fase da minha vida, aquela em que lá vivi e onde tudo era novo e mágico. Talvez tenha sido uma fase que passou e não volta mais. Não sei o que foi, mas sinto que nem eu nem ele sentimos o mesmo. Perante a pergunta: 'Então, foi bom voltar?', a resposta traduzia-se quase sempre num 'sim' pouco convincente.
É bom voltar sem dúvida, reviver aquelas cores, o frio que se entranha na pele e nos greta as mãos e os labios, a multidão de rostos completamente desconhecidos, a aspereza de uma língua que é tão familiar quanto estranha, o café de gosto aguado e queimado, as tapas de queijos e presunto que comíamos com sôfrega gula, as cañas e os copos de sangria que bebíamos e brindávamos a nós, ao futuro, ou simplesmente por serem duas da manhã e as ruas estarem tão cheias como às duas da tarde...
Por tudo isso foi bom voltar, mas foi ainda melhor regressar a casa ao fim de quatro dias.

terça-feira, outubro 30, 2007

one step closer to 30

29


Ou como quem diz, mais perto dos 'intas' e longe dos 'intes'.
Fico sempre melancólica, sentimental e vulnerável no meu dia de anos. Não consigo evitar, mexe comigo, destabiliza-me. Geralmente faço sempre uma análise da minha vida e acho que é por isso que fico assim, com a confiança abalada, com as estruturas bambas. Prometo sempre a mim mesma que este ano não me vou deixar vencer, que serei superior a tudo isso, que vou andar de sorriso nos lábios, alegre e feliz da vida, mas nunca consigo.
Acho que é por ver, cada vez mais, que os meus objectivos estão cada vez mais longe de serem alcançados e de não conseguir atingir aquela serenidade e sabedoria que dizem, os outros, conseguir-se com a idade. Odeio-os a todos por apregoarem essas balelas aos quatro ventos, fazendo toda a gente acreditar nelas. Não consigo ser serena e feliz com a idade, nem sentir-me cada vez melhor comigo mesma. Aliás, sinto que o tempo passa por mim a uma velocidade estonteante e eu sinto-me cada vez mais pequena, mas medíocre, menos eu.
Acho que serei sempre uma eterna insatisfeita.

segunda-feira, outubro 29, 2007

entranhado

Hoje foi dia de biópsia no Hospital Curry Cabral. Apesar de não estar nervosa, estava ansiosa e não consegui dormir correctamente durante a noite. Acordei às quatro e pouco da manhã, depois às cinco, novamente às seis, até que saltei da cama eram sete horas, não valia a pena insistir no sono que não existia. Tomei um banho rápido, vesti-me, tomei o pequeno-almoço e fui andando para o hospital. Já sei que apanho sempre trânsito de manhã no túnel das Olaias e na Avenida de Berna, por isso, mais valia pôr-me a caminho quanto antes. Hoje correu tudo muito bem. Fui simpaticamente atendida pela mesma rapariga que há duas semanas atrás não quis ajudar um colega e se recusou a pegar no meu processo. Mais, fiquei a saber que faz anos na mesma semana que eu e que somos da mesma idade. Meteu conversa comigo sobre isso. Sorri-lhe educadamente. Esperei uma eternidade na sala de espera, pelo menos assim pareceu. Fui chamada por um intercomunicador onde mal se percebia o meu nome. Subi ao primeiro andar e entrei no consultório marcado, o 18. Reconheci a cara da médica que há duas semanas atrás quase se recusou a atender-me. Hoje quis conversar comigo, perguntar-me coisas sobre a minha infância, qual o aspecto que a pele tinha quando era pequena, quais as zonas mais problemáticas, etc.. Respondi-lhe sempre com a sensação de que ela não percebia nada daquilo que me perguntava, coisa que me irrita solenemente. Mandaram-me despir, queriam ver-me novamente. Assim fiz. Entretanto chegou a médica que iria analisar a biópsia. Decidiram escolher a zona da dobra do joelho para fazerem a extracção. Ao saber isso fiquei apreensiva. É uma zona de difícil acesso, sensível e delicada para levar pontos e cicatrizar, além de me prender os movimentos motores. Lá me levaram para uma outra sala onde me pediram para vestir uma bata e me deixaram descalça. Pedi umas pantufas de plástico, algo para meter nos pés. (odeio hospitais públicos, odeio, odeio, odeio…) A estagiária que seguia a médica para todo o lado lá tirou umas quantas pantufas de plástico que estavam enroladas sobre si mesmas na prateleira de um velho armário e deu-me um par para as mãos. Sempre me senti mais protegida, mesmo no plástico os meus pés reconheceram um conforto que não identificavam nas lajes de pedra geladas. A sala onde me deitei tinha uma maca antiga e uma enfermeira carrancuda com cara de poucos amigos que me olhava de soslaio. Decidiram que seria mesmo na dobra do joelho que me iriam fazer a biópsia, deram-me anestesia para aliviar a dor mas não foi suficiente… sentia a agulha a entrar-me na pele e as mãos das médicas e das enfermeiras a fazerem pressão na perna enquanto a mesma dáva esticões. Reforçaram a dose e finalmente lá me picaram, deixando-me um buraco com cerca de 5 mm na curvatura da perna. Coseu-me, mas teve dificuldade em dar-me os pontos devido à zona em que me furou. Ataram-me a perna com ligaduras e disseram-me que hoje não poderia estar de pé nem fazer grandes esforços, queriam mesmo mandar-me para casa, eu é que não deixei e disse que tinha de ir trabalhar. Saí do hospital com a data de 3 de Dezembro como o dia em que saberei afinal, que tipo de ictiose é a minha e a partir daí, voltar à minha luta, desta vez mais forte e confiante de que desta vez é que é.
E eu acredito que será.

quarta-feira, outubro 24, 2007

vícios

Ando viciada numa série de coisas ultimamente, nas mais diversas áreas e interesses. Algumas delas já falei aqui, outras, revelo-as agora em primeira mão. Achei que estava na hora de as mostrar. Sabendo os meus vícios também sabem mais de mim.
Blogues:
Ana de Amsterdam - O nome engana, mas há semelhança da música de Chico Buarque, também esta Ana se revela em cada palavra. No seu blogue - que é simplesmente excelente - a autora é dona de uma lógica que invejo e de uma escrita que me faz sentir pequenina e tacanha em tudo o que digo, como digo. Ainda eu às vezes, penso que um dia - nesta minha pequena cabeça -poderei ser escritora... É simplesmente ridículo, tonto, vulgar...
Guardem-no nos favoritos. Visitem-no até à exaustão, leiam-no atentamente. Merece a pena.
Post secret - Um blogue que visito regularmente desde os tempos em que tinha o livejournal. Fascina-me o lado frágil e secreto do ser humano. A forma como as nossas vidas não têm os contornos que desejamos, mas aqueles que fazemos deles. Às vezes assusta pela forma como a loucura residente em cada um de nós é revelada, mas ela existe, e é por isso mesmo que gosto de o visitar. Porque é feito por pessoas como eu e tu, porque mostra-me que afinal, apesar de tudo, a minha cabeça ainda está no lugar, mas segredos todos nós temos.
Música:
Samba Meu, Maria Rita - Já falei dele aqui é certo, mas não consigo ouvir outra coisa ultimamente. No carro, em casa, no ipod, no trabalho. As notas animadas e ritmadas dos sambas brasileiros, alegres e melodiosas, de português suave e doce, entram no meu ouvido com um encanto e alegrias quase desproporcionais à minha situação actual. Acho que no fundo, gosto de acreditar que em cada música, uma nova esperança vem ao meu encontro. Mais do que tudo, preciso disso.
Séries:
Brothers & Sisters - Dá na Fox (não sei em que dia da semana, mas geralmente consigo vê-la sempre) e na TV2 às sextas-feiras à noite. Sempre gostei de histórias familiares. Penso muitas vezes que se escrevesse um livro (lá estou eu) seria sobre histórias familiares. Gosto da forma incoerente em que as famílias vivem. Aquela maneira de amar tonta, alternada tantas vezes pela ira, pela culpa, pelos segredos, pela forma como todos se perdoam e vivem. Tenho histórias fantásticas na minha família, histórias que também mereciam ser reveladas, lidas, vistas, ouvidas. Qualquer dia falo sobre elas aqui. Até lá, fica apenas o apontamento de que gosto da série e gosto ainda mais da Sally Field. Grande senhora.
Anatomia de Grey - Descobri o vício tarde, mas ficou entranhadíssimo. Tenho um amigo meu que diz que a Anatomia de Grey não é uma série, é uma novela, daí gostarmos dela. Não deixa de ter razão. Esta 'novela' sobre a vida e o dia-a-dia de um grupo atraente de médicos num grande hospital não preza pela imaginação - a fórmula já existe há muito tempo, mas é sempre sinónimo de sucesso - mas como tantas outras séries sobre grupos de médicos atraentes, esta possui um lado humano que me agrada e cativa, diferente de todas as outras. Gosto da forma como as personagens femininas são um dos principais motores de toda a história. Como se revelam em cada episódio. Gosto da dureza e frieza da Cristina, da doçura da Izzie, ou da forma justa e implacável da Miranda Bailey. Gosto da série porque as mostra vulneráveis. Mesmo sendo médicas, mesmo sendo atraentes, mesmo trabalhando num grande hospital.
É a série que neste momento anima os meus serões e nunca perco um episódio. Bendita Fox Life à borla. Foi a melhor coisinha que a TV Cabo pôde fazer.
Vícios largados
Tabaco - Há seis dias que não toco num cigarro. Acabaram-se os cravanços por parte da minha chefe. Confesso que ontem me deu um gozo descomunal, perante um intransigente: 'Mafalda, dá-me um cigarro', dizer-lhe de forma calma e serena e bem na cara a frase: 'Deixei de fumar'. Foi como se o vício tivesse compensado.

desabafo

Cada vez me desiludo mais com as pessoas. Aliás, está a tornar-se tão frequente que não sei como é que ainda me surpreendo.

quinta-feira, outubro 18, 2007

transparência II

Hoje tentei estar o mais calma possível e não pensar muito nos acontecimentos do dia de ontem. Mesmo depois de ter acordado a meio da noite, assustada com um sonho, em que caminhava sobre lajes de papel, por cima de uma catarata de água enorme e muito forte, quando as mesmas cederam e eu caí no abismo, levada pela enxurrada. Se me recordar do sonho, ainda consigo visualizar o momento em que caía, o pânico que senti ao aperceber-me que não tinha chão por baixo dos pés. Acordei sobressaltada e demorei algum tempo até voltar a adormecer. Hoje lembrei-me disto várias vezes. Realmente os sonhos têm um simbolismo curioso e não duvido nem por um segundo, de que este é muito revelador da forma como me sinto face aos acontecimentos dos últimos dias.
Houve muita gente no trabalho que me perguntou 'então, foste ao médico, como correu?' e eu nunca dei parte fraca, nem nunca me desmanchei com qualquer tipo de pormenores. Sorria e apenas dizia 'oh, foi num instante, nem devia ter tirado o dia', não dando mais oportunidade a perguntas. E pronto, arrumava o assunto. No entanto, como estava preocupada por causa do resultado da biópsia que fiz o mês passado ao cólo do útero, andei o dia todo a tentar contactar a minha ginecologista, mas sem sucesso. Pegava no telemóvel, saía do meu lugar sorrateiramente e vinha sentar-me cá para fora, para as escadas de emergência, onde ninguém me ouvisse. Após várias tentativas frustradas, lá consegui falar com a médica que me realizou o exame - também ginecologista - onde consegui esclarecer certas coisas que me andavam a pôr macaquinhos no sótão. Também consegui que ela me ajudasse a alterar a data do tratamento já para o próximo mês, logo a seguir à minha próxima menstruação - o que me permite fazer o laser mais cedo do que eu pensava e começar a curar isto de uma vez - sem esta ajuda, só tinha vaga a 20 de Dezembro. Após isto fiquei mais calma e tranquila. Antes passei pelo assustada e pelo preocupada q.b., mas agora é como se algo dentro de mim me dissesse com toda a certeza: 'tudo se vai resolver, acredita' e eu como sempre fui de seguir os meus instintos, irei acreditar neste com mais força do que em todos os outros.
Na realidade, após o dia de ontem, que foi uma espécie de montanha russa de emoções, hoje estive serena. Fiz por estar bem e evitei andar cabisbaixa, triste ou de lágrima fácil. Não sei se será normal este meu comportamento à luz da psicologia, mas resultou, o que pode explicar das duas uma: que ou tenho uma fantástica capacidade de lidar com os problemas, ou que sofro do síndroma da bipolaridade - o que, diga-se de passagem, não me estranhava se assim fosse.
Hoje já tranquilizei a minha mãe com as novidades. É que ontem, após lhe ter comunicado tudo o que tinha acontecido, ficou tão afectada que pegou no carro e fez mais de 40 quilómetros para ir visitar a irmã e lhe despejar tudo o que tinha acabado de lhe contar. Fiquei enervadíssima quando mo disse. Fartei-me de lhe dizer que essas coisas não se dizem, que ela não tinha nada de ir a correr abrir a boca, que é um assunto privado e intímo que só a mim me diz respeito e que não gosto que a família fique a saber destas coisas... mas, tal como já o disse tantas vezes, a minha mãe anda a passar por uma fase emocional instável e a reacção às minhas críticas, foi a de se fazer de vítima e gritar comigo. Não é que eu não saiba que ela o fez sem maldade, porque estava preocupada, porque precisou de alguém com quem desabafar, que recorreu a um familiar próximo para o fazer, mas quando se trata da minha vida pessoal, dos meus problemas, de assuntos que só a mim me dizem respeito, fico passadíssima quando sei que terceiros andaram a falar deles, a comentá-los, sem saberem em concreto do que se trata, a exacerbarem o síndroma da 'coitadinha' que tanta urticária me provoca. Seja a minha mãe, seja quem for.
Mas pronto, já me passou. Amanhã irei tentar novamente falar com a minha médica ginecologista com a qual não consegui falar hoje e tentar saber a opinião dela, assim como aguardo o parecer de um outro médico, a quem pedi ajuda através de uma amiga. Quantas mais opiniões tiver, mais informada e esclarecida fico sobre o assunto - além de ver a gravidade ou não da questão.
De resto o dia foi calmo. A minha chefe finalmente regressou de lua-de-mel. Vem felicíssima, com um sorriso de orelha a orelha e um brilho forte nos olhos. Nunca a tinha visto assim. Realmente o casamento fez maravilhas...

quarta-feira, outubro 17, 2007

transparência

O tão aguardado dia da consulta chegou, mas não surtiu o efeito esperado, se é que esperava algum efeito. Depois do final do dia de ontem, o princípio do dia de hoje deixou-me insegura e vulnerável, com todas as emoções à flor da pele. Sentia-me emocional, incapaz. Cheguei ao hospital às 9h30 e assustei-me com o mar de gente que tinha acordado mais cedo do que eu e aguardava naquela sala de espera velha e angustiante. Fui atendida por um rapaz simpático que de repente, pediu ajuda à colega do lado, e acabou por ser rebaixado à frente de toda a gente. Tinha ar de cabra, não gostei do aspecto dela. Não o ajudou. Ele abanou a cabeça e desabafou entre dentes, depois olhou-me nos olhos à procura de uma expressão de solidariedade, deu-me um sorriso de conforto e pediu-me desculpa. Era simpático ele. Nem o nome lhe soube.
Aparentemente os serviços do hospital enganaram-se ao marcar a minha consulta e atribuiram-me o médico errado. Depois de uma enorme confusão, onde queriam aterar a data da consulta e adiá-la para daqui a duas semanas - a qual eu recusei - e nem mesmo após muita insistência minha em lhes fazer reconhecer que o erro tinha sido deles e demonstrar o transtorno que me causavam - esperei mais de 3 meses pela consulta, tive de faltar ao trabalho, etc. - fui atendida por um médico que sofria do síndroma da altivez e arrogância clínica, que me subjugou assim que entrei no seu gabinete. Relativizou tudo o que disse, riu-se quando lhe falei no nome da médica que me reencaminhou para aquele hospital e mandou-me despir, quase confiante de que aquilo que eu tinha não passava de uma simples 'pele seca'. Respondi-lhe ásperamente. Sempre. Consigo ser muito dura quando quero. Demais até.
Ironizei quase com satisfação quando lhe disse que 'tenho mais do que uma simples pele seca' e ele, ainda não convicto das minhas palavras, continuou: 'dispa-se, dispa-se, já vamos ver isso'.
E viu. E calou.
Nesse momento quase que lhe consegui dissecar a expressão de surpresa no rosto, a forma como lhe foi difícil reagir e articular o discurso. Disse repetidas vezes para si próprio: 'isto não é ictiose vulgar, a menina não tem ictiose vulgar' e saiu disparado da sala, alarmado, não sem antes me dizer para eu não sair dali, enquanto ele corria a chamar os restantes médicos da ala de dermatologia. E vieram todos, como uma grande comitiva, olhar para mim semi-nua, em cima de uma maca, tal e qual uma cobaia.
Este tipo de situação já me ocorreu um par de vezes. Normalmente, quando sinto que alguém me olha fixamente, ou com expressão de ponto de interrogação, sei o que lhes atravessa a alma naquele instante. Geralmente não os censuro. O desconhecido sempre fascinou o seu humano. Eu própria sofro do mesmo male. Mas, para demonstrar de que sei perfeitamente o que lhe vai dentro das cabecinhas, naquele preciso instante, fixo bem a pessoa, encaro-a de frente e, tal como os leões, não sou eu a primeira a desviar o olhar. A outra pessoa acaba por fazê-lo, constrangida, intimidada. Isto acontece-me por vezes nas situações mais banais - na praia, no verão quando ando mais destapada, ou quando alguém começa a olhar bem para mim e a ver que afinal, as minhas mãos, ou os meus cotovelos, não são bem iguais aos seus. Mas os médicos conseguem ser bem mais cruéis. Fazem-no friamente, como se fossemos um trapo, ou melhor, um boneco articulado e conseguem tirar qualquer tipo de dignidade que consigamos manter naquele instante.
Uma vez, no Hospital de Santa Maria fui mostrada quase como objecto de análise e de estudo (retiro o 'quase', porque foi mesmo isso que se tratou), a uma turma de estagiárias que me olhavam com olhos de piedade e de comiseração. Lembro-me que me mandaram despir e que de repente, sem eu saber, entraram cerca de 30 raparigas de batas brancas e cadernos na mão, que tiravam notas e segredavam entre si à medida que eu, uma jovem mais nova do que elas, era mostrada de frente e de costas por uma médica que falava articuladamente mas sem qualquer tipo de afectividade no discurso. Nesse dia chorei desalmadamente. Lembro-me que me enfiei no metro e chorei. Chorei muito. O caminho todo. Saí do metro e chorei. Entrei em casa e chorei. Lembro-me de o meu pai saber do episódio e de dizer que vinha a Lisboa e lhes partia a boca toda. Lembro-me de me sentir protegida por ele.
Desde esse dia que tenho pânico de grandes e velhos hospitais públicos. Desde esse dia que sempre procurei ajuda nos privados. Hoje, naquele velho e grande hospital público que é o Curry Cabral, vista por todos aqueles médicos, em cuecas e sutiã, deitada em cima daquela maca, lembrei-me desse dia. E tal como há dez anos atrás, chorei muito. Muito mesmo. Mas mantive sempre a carapaça dura e, se há dez anos eu não consegui pronunciar uma palavra em minha defesa, actualmente as coisas não são assim. Mas mesmo dando uma de durona, quando me vejo livre daquele ambiente que me oprime, geralmente desabo.
Marcaram-me duas biópsias para o dia 29 de Outubro, tudo porque afinal, a doença que me acompanha há quase 29 anos e que sempre pensei tratar-se de ictiose vulgar, ao que parece é uma variante de Ictiose mais gravosa - Ictiose Hiperqueratose Epidermolítica - provavelmente ligada ao cromossoma X, o do sexo feminino, o que também poderá explicar o facto de eu e a minha mãe a termos. Se a biópsia comprovar este diagnóstico que me foi avançado hoje, talvez, mas mesmo só talvez e entrando no campo das probabilidades, poderei repetir o teste genético. Mas ainda é tudo muito novo e recente para falar sobre o assunto.
À tarde encontrei-me com uma amiga, pedi-lhe ajuda, liguei-lhe a dizer que precisava de desabafar e ela veio logo, disponível para me ouvir como o faz há longos anos. Falámos durante horas, ouvi conselhos, descomprimi, relaxei, para em seguida, enfiar-me no cabeleireiro e ter direito a um verdadeiro tratamento integral: pintei, fiz nuances, cortei e no fim estava linda e maravilhosa.
É realmente fantástico o poder que uma ida ao cabeleireiro faz à alma.
adenda: Hoje o dia também foi marcado pela avaria do nosso frigorífico. Realmente uma desgraça nunca vem só.

terça-feira, outubro 16, 2007

reveses

Aqui no trabalho, todos recebemos nesta última semana, telemóveis novos. Após tanto tempo de espera, finalmente, mas mesmo finalmente, decidiram-se a dar novos aparelhos às pessoas. A boa notícia animou as hostes. Toda a gente se entreteve com o novo brinquedo e ficou feliz por finalmente o departamento financeiro ter aberto os cordões à bolsa. É que havia verdadeiros telemóveis ‘pré-históricos’. Eu, por exemplo, que apenas tive direito a cartão na altura, andava com um velho aparelho meu, que vê agora chegar a tão esperada reforma.
O problema relacionado com os novos telemóveis veio depois, ou melhor dizendo, decorre actualmente. Como os toques que vinham de origem eram escassos e quase todos monocórdicos, a malta desatou toda a fazer dowloads do site da operadora e o resultado é que agora existem três ou quatro pessoas com a música da Vanessa da Mata e do Ben Harper (a mesma que tenho no meu blogue) a tocar a cada instante. Confesso que já estou enjoada da música e cada vez que a Vanessa da Mata canta o refrão ‘é demais, é pesado, não há paz’, penso que a letra não podia ser mais apropriada para o martírio auditivo que se vive por aqui. Depois há outros que têm a Rihanna e o seu ‘Umbrella’ (que eu acho simplesmente intragável), ou tão somente, o Jorge Palma com o seu ‘Encosta-te a mim’ (e eu que gostava tanto da música)…
É o que faz estar num espaço fechado com pessoas com gostos musicais idênticos ou tão dispersos. Ter uma música no telemóvel até é giro – eu própria tenho uma – mas o meu telemóvel não toca a cada cinco minutos, perturbando as restantes pessoas e fazendo com que uma música que até se gostava, passe de bestial a besta.
Entretanto ainda não tinha dito aqui, mas devido à minha participação em alguns concursos literários, no próximo Sábado irei até Redondo, no Alentejo. O motivo? Participar na cerimónia de entrega de prémios do concurso literário que a Câmara Municipal do Redondo promoveu há uns meses atrás e ao qual eu concorri. Foi apenas um texto simples de 4 páginas, onde o tema do concurso era ‘O blogue enquanto espaço de escrita e reflexão’. Eu achei que dada a minha experiência no assunto, podia escrever algo que até fizesse sentido e vai daí, meti mãos à obra. Afinal, já não é de agora que escrevo nestes espaços cibernéticos. Não alimento qualquer tipo de esperanças de ganhar nada, mas quero ir apenas pelo prazer de ir e de sentir que participei em algo, que concretizei. O convite chegou a semana passada e foi colocado em cima do aparador da sala para que não me esqueça. Haverá apenas três premiados, sendo que todos os restantes participantes receberão um diploma. É isso que estou mentalizada que irei receber, mas claro que trazer um diploma de participação e um cheque para casa, era muito mais giro…
Hoje sonhei com o Dr. Mário do Porto, provavelmente por ansiedade, motivada pela consulta de amanhã. Já pedi ao C. para me levar bem cedinho com ele quando for para o trabalho e deixar-me à porta do hospital, assim evito levar o carro e ter de estar sempre preocupada com o parquímetro e as multas da Emel na zona. Também já avisei na agência que irei tirar o dia. Apesar de não querer criar muitas expectativas em relação à consulta ou o que daí poderá advir, não consigo deixar de pensar que esta é a última hipótese que me resta nesta minha saga pessoal contra a ictiose. Talvez por isso, tenha sonhado com o Dr. Mário - com quem já não falo há meses. É como se a imagem dele me tivesse aparecido em sonho para me relembrar que esta é mesmo a minha última chance. Se assim for, o mais provável é que nunca mais volte a vê-lo fisicamente e a única forma, seja mesmo só sob a forma de sonho.
Ainda falando em médicos e afins, acabei de chegar a casa e tinha uma carta da Cuf com o resultado da biópsia ao útero que fiz no mês passado. Quando a li, fiquei assustadíssima. Não que perceba muito de linguagem médica, mas aquilo que conseguia discernir, não me augurava nada de bom. Fui instintivamente pesquisar na net as palavras do resultado e tudo o que me aparecia remetia para cenários negros. Comecei a ficar cheia de suores e nervosa com medo de que tivesse algo grave. Liguei para a minha médica ginecologista e, logo por azar, ela hoje nao dáva consulta. Não desisti e liguei para o hospital onde falei da situação a quem me atendeu a chamada, disse que necessitava de falar com um médico, alguém que me dissesse em concreto o que aquelas palavras significavam. Lá me passaram para o departamento de ginecologia. Fui atendida por uma senhora simpática, onde após a leitura do resultado citológico, me disse: 'não é cancro, mas tem de se tratar' e eu lá me acalmei. Confesso que ainda não consigo voltar a mim, respirar de forma calma ou compassada. O meu coração disparou a cem à hora quando comecei a ver que tudo aquilo que ambiciono, poderia esfumar-se assim, sem ter nada a ver com o motivo pelo qual ando a mover montanhas e o mundo há tanto tempo. Senti-me impotente, fraca mesmo. Sei que não irei tranquilizar até conseguir fazer o tratamento que me espera - um laser Co2 do cólo do útero - mesmo já tendo feito duas criocongelações infrutíferas. Só quero que o tratamento seja feito em breve, muito breve.
Sinto que não conseguirei descansar direito enquanto não o fizer.

segunda-feira, outubro 15, 2007

Samba Meu




















Estou apaixonadíssima pelo último albúm da Maria Rita, 'Samba Meu'. Depois de um último trabalho mais melancólico e intimista, Maria Rita regressa cheia de sensualidade, segurança, humor e muita feminilidade. À beira de completar 30 anos, a filha de Elis Regina revela-se uma mulher madura.
E para começar bem o dia, nada como ouvir o mesmo, numa segunda-feira bem cedinho a caminho do trabalho, para ficar logo bem disposta.

domingo, outubro 14, 2007

relax, take it easy...


















Finalmente o tão desejado fim-de-semana chegou e eu vinguei-me dormindo cada minuto que pude. No sábado o corpo fraquejou, deu sinais de início de gripe e eu enfrasquei-me logo em medicação, não fossem os virús ganharem esta batalha. Fiquei grogue a maior parte do dia, dormindo o sono dos justos e recuperando de uma semana mal dormida e muito cansativa. Só saímos à noite, qual vampiros, para jantar e ir ao cinema (programa que já não fazíamos há algum tempo). A escolha recaíu sobre o Nood, o restaurante da moda de Lisboa, que alterna entre comida vietnamita, japonesa e tailandesa. Gostei, mas achei-o muito barulhento, além de a comida não me ter convencido. Não troco o chefe japonês do Assuka pelo Nood, por mais gira e cosmopolita que a decoração do mesmo seja. Achei graça à parceria que têm com a Nike e à BD em tamanho gigante que existe nas paredes, gostei da rapidez do serviço e da forma prática com que tudo é feito, do grafismo do logo e das ementas, mas achei que já não me enquadrava no target de idades vigentes, cuja média não devia de ultrapassar os vinte anos. Jantámos num instante - acho mesmo que demorámos menos tempo a jantar do que a conseguir entrar no parque de estacionamento do Chiado ao pé do largo do Carmo - e em seguida decidimos experimentar o café 'Saint Germain' mesmo ao lado do Nood, que nos chamou a atenção pelo seu bom aspecto (porque os olhos também comem, não é verdade?...)
O café era da Lavazza - marca que o C. simplesmente adora - e, para além do aspecto 'clean' proporcionado pelos arcos em pedra e pelas fotografias gigantes a preto e branco que se encontram nas paredes, o 'Saint Germain' revelou-se um espaço bastante agradável para um café no Chiado... mas claro que não bate o meu preferido e insubstituível 'Vertigo' uns metros mais à frente. Como já era quase meia noite decidimos ir andando até ao El Corte Inglés e ver que filmes havia em exibição. Quando lá chegámos nada nos despertava a atenção. Escolhemos um filme leve ao acaso e fomos os dois pouco convencidos até à respectiva sala, mas afinal até nos rimos e deu para descomprimir.
Hoje dormi outra vez até tardíssimo. Soube maravilhosamente bem para ser franca. Adoro acordar sem o peso das horas e preparar uma refeição de fim-de-semana. Geralmente optamos sempre pelos grelhados, ponho a mesa (coisa rara, já que temos muita tendência para comer no tabuleiro e sentados no sofá, devido à nossa disparidade de horários) e por momentos, parecemos um casal 'normal', num Domingo 'normal'. Nunca é, porque o C. geralmente vai sempre trabalhar e hoje não foi excepção.
Ainda não tinha mencionado aqui, mas o seguro recusou-se a comparticipar a minha operação às varizes. Nem um cêntimo dão para ajuda. Alegam que 'a doença já é anterior à data de realização da apólice' e que por esse motivo, não a irão comparticipar. Passei-me. Tenho dois seguros e nenhum deles comparticipa a operação. Eu já sei como funcionam as seguradoras, mas é ultrajante a forma como tratam as pessoas quando realmente precisamos delas. Pago eu quase 50 euros por mês para ter direito a seguro privado e quando preciso dele, o mesmo faz-me um par de manguitos. Por causa disso, desmarquei a operação. Neste momento não me posso dar ao luxo de pagar mais de 5000 euros do meu bolso, pelo que terei de esperar até estar melhor de finanças para o fazer. A minha mãe disse-me para tentar ir pela caixa. Irei fazê-lo, mas já sei que terei de esperar uns 3 anos - no mínimo - até conseguir ser operada...
Não me interpretem mal, mas no que toca a estas coisas, cada vez tenho mais vergonha de ser portuguesa...
Mas nem tudo são más notícias. Descobri a semana passada, que já estou oficialmente 'efectiva' na empresa! (finally!) O que deixa muito satisfeita porque apesar de todas as minhas queixas, cumpriram com tudo o que me prometeram: "um ano de contrato e depois passas aos quadros". E assim foi. Apesar de hoje em dia o 'estar efectiva' já não corresponder à mesma segurança de há uns anos atrás, confesso que fiquei bastante feliz com a notícia, é sinal de que estão satisfeitos com o meu trabalho. Na realidade, estas últimas três semanas em que a minha chefe esteve de férias, pude mostrar realmente aquilo que sou capaz de fazer, sem 'intermediários' pelo meio... e acho que fui bem sucedida. Claro que os castings e o lufa-lufa de norte a sul do país também ajudou...
Esta semana que começa estou ansiosa pelo dia de quarta-feira. A tão aguardada consulta de dermatologia no Curry Cabral está a chegar. Veremos que novidades, esperanças ou frustrações a mesma me reserva.
Torçam por mim. *

quarta-feira, outubro 10, 2007

around and around

Fazer castings é uma coisa horrorosa. Primeiro porque não tenho muita paciência e tenho de ser agradável, simpática e ajudar as meninas que estão sempre todas muito nervosas e impacientes. Segundo porque por mais que me divirta com a equipa, são sempre dias muito esgotantes e trabalhosos. Fazer castings até pode soar a engraçado - quem nunca se riu com os castings dos Ídolos que ponha o dedo no ar - mas estar um dia inteiro a fazer perguntas a meninas e meninos, a vê-los desfilar e a falar para a câmara, chega a ser monótono. Algumas, com a mania que são espertas e que têm imensa piada/graça, querem ver que classificação lhes dou na ficha que preencho e nessa altura confesso, só me apetece bater-lhes. Mas lá me muno de tolerância de santa, respiro fundo e apesar de tentar pô-las na ordem, esboço o meu melhor sorriso e faço uma qualquer graçola para as descomprimir. Durante a manhã, enquanto ainda estou fresca e viçosa a coisa corre bem, mas à tarde, quando o peso das horas já começa a fazer mossa e já passaram por mim mais de 600 pessoas, é de bradar aos ceús. No entanto, volto a respirar fundo e toda a técnica do marketing do sorriso regressa ao início, vezes e vezes sem conta, qual pescadinha de rabo na boca. Tem sido assim nos últimos dias de norte a sul do país, felizmente o final está próximo.
Ontem ainda consegui ir à agência. Deu para terminar uma proposta, ter uma reunião de manhã - onde fiquei plantada uma hora à espera da pessoa com a qual me ia reunir -, fazer contactos e contar as peripécias dos últimos dias aos colegas. Pelo meio ainda consegui falar no messenger com a Diane e perguntar como vai a gravidez. Ela estava grávida de gémeos e perdeu um dos embriões, mas o outro felizmente, salvou-se. Disse-me que agora está tudo bem, mas que tem pena de não ir mais vezes ao médico para ficar mais descansada. Disse-me também que se sente sempre constrangida quando fala da sua gravidez comigo, que sente culpa por estar grávida e eu não, que sabe que o facto de ter conseguido engravidar e ter um filho saudável (ao contrário de mim) me provoca dor. Disse-lhe que não tem de se sentir culpada de nada, porque na realidade, o facto de não conseguir fazer qualquer tipo de tratamentos para ter um filho saudável é um problema meu, não dela e como tal, não tem de se sentir lesada por isso. No fundo compreendo perfeitamente que ela se sinta responsável e que assuma parte da 'culpa', porque afinal, foi através dela que tive conhecimento dos tratamentos e do teste genético... mas o facto de ele ter dado negativo não é culpa dela, nem minha... é tão somente um grande azar como tantos outros que acontecem na minha vida.
Claro que me magoa não poder ter o mesmo tipo de felicidade, ou pelo menos de esperança. Magoa sim, magoa muito. É uma espécie de dor silenciosa que me fez ficar muito revoltada perante tudo e sinto que isso se nota cada vez mais, até em pequenas coisas do meu dia-a-dia, mas que posso fazer? Neste momento, aquela consulta tão distante que marquei há muitos meses atrás, está próxima. É já na próxima semana que irei à consulta no Hospital Curry Cabral e talvez aí, as minhas esperanças se renovem, lentamente, como a água que pinga de uma torneira mal fechada. Nem gosto de criar expectactivas, nem quero sonhar muito com medo de acordar e bater com a cara no chão, mas vou acreditar que há uma nova porta para abrir e ela está próxima.
Já aqui disse várias vezes que a minha vida é feita de esperas. É verdade. Mais do que nunca rejo-me por datas, etapas, pequenas conquistas e muitas derrotas. Tem sido um ano duro, muito duro. Tão duro como nunca imaginei que ele se tornasse, porque acreditei piamente que 2007 ia ser um ano bom, muito bom, um ano de concretização. Não foi. Não está a ser.
Resta-me apenas acreditar (outra vez) que para o ano é que é. E assim sucessivamente até algo acontecer. De momento ando a contar os dias para a operação (1ª etapa), mas ando a pensar seriamente adiá-la... é que além do trabalho volumoso e louco das últimas semanas, o valor da mesma é tão elevado, que muito provavelmente não terei dinheiro que me valha para pagá-la, além de o seguro de saúde se andar a tentar esquivar à força toda e de eu estar a ver tudo isto muito mal parado... O C. sugeriu adiarmos para Janeiro, mas se me decidir por isso, terei de repetir todos os exames que já fiz, assim como análises. Não sei o que faça sinceramente. Assim que o seguro se pronunciar, ou adio e desmarco, ou faço-a e se tudo for avante, falta uma semana e meia para ir 'à faca'.
Nem me atrevo a falar destas coisas com a minha mãe, porque emotiva e 'sensível' como anda (para não utilizar um adjectivo mais forte e depreciativo), o mais provável é entrarmos em rota de colisão uma com a outra e acabarmos chateadas. O meu pai insiste em ligar-me a dizer para eu não me esquecer de ir 'escolher um colchão para a cama nova', (a tal que comprámos no Ikea...) mas por mais que lhe explique que tenho andado numa roda viva entre Faro/Porto e Lisboa, e que não tenho tempo nem para me coçar quanto mais para ir ver de colchões, ele só diz que eu tenho de tratar disso até dia 22 de Outubro, data da operação. E é se quero ir lá para casa e ter onde me deitar...
P.S.- E o frio quando chega? estou farta deste Outono quente e morno.

domingo, outubro 07, 2007

2

Dois anos é um sopro, um vento leve, uma brisa que toca suavemente na pele, é uma gargalhada profunda e sentida que conforta a alma, é um sorriso bonito e aberto, é um abraço apertado, um suspiro profundo, um arrepio de frio, um calor que percorre e aquece. Dois anos é um tempo curto, ditado pelo calendário e pelas memórias das gentes. Foram dois curtos anos, um piscar de olhos.
O tempo de dizer 'amo-te'.
Parabéns a nós*




fuga



















Eu cheguei na sexta-feira à noite, cansada e mal humorada, depois de um dia de feriado a trabalhar e de na véspera, termos tido a aventura de uma vida a caminho do Algarve (ficámos empanadas com o carro, tivemos de chamar a assistência em viagem, fomos de táxi de Grândola até Faro, apanhámos uma operação stop pelo caminho e chegámos ao Hotel à uma da manhã mais mortas que vivas...). Perante os acontecimentos dos últimos dias, a minha vontade de fazer as malas e partir novamente para um destino que apesar de perto, exigia a dormida fora de casa, deixáva-me ainda com mais vontade de não sair do meu canto, mas fui contrariada e regressei feliz. O que é sempre bom sinal.
O C. preparou-me uma surpresa bem pertinho Lisboa, o que acabou por ser positivo, porque não tive de fazer outra grande viagem e bastava apenas passar a ponte. Ficámos no novíssimo Hotel Meliã Aldeia dos Capuchos, na Costa da Caparica e à noite jantámos no Borda D´Agua na praia da Morena. Foi calminho, mas foi romântico. Hoje passeámos até Sesimbra, com um dia de Sol de Outono fantástico e regressámos a Lisboa ao final da tarde, cansados, mas satisfeitos por afinal, tudo ter acabado bem - depois do desespero que foi conseguir arranjar um hotel onde passar o fds!
Neste momento, ainda nem recuperei dos dias intensos de trabalho e já estou prestes a fazer novamente as malas para amanhã, rumar às sete da matina, até ao Porto e por lá passar a noite, regressando a Lisboa apenas na Terça.
Seja como for e contrariando todas as nossas expectativas, este fim-de-semana a dois permitiu-nos estar juntos e celebrar uma data, que apesar de ser só uma data, nos é bastante especial. No final o C. surpreendeu-me com um postal que ele próprio fez com uma foto nossa e uma mensagem muito querida e sentida. A acompanhá-las vinha também um presente que me tocou bem cá no fundo do coração: os poemas completos de Miguel Torga. (e me fez despejar um verdadeiro mar de lágrimas, descarregando a tensão das últimas semanas.)
Foi bom. Sinto-me cheia.
'Foram dois anos que passaram a correr, mas os próximos 60 serão ainda melhores'.
Que seja feita a tua vontade*

quinta-feira, outubro 04, 2007

workaholic



















Estas últimas semanas têm sido de loucos e o trabalho tem sido tanto, mas tanto, que não tenho tido tempo sequer de actualizar o blogue. Duas semanas depois de ter vindo do Algarve em trabalho, eis que regresso, também em trabalho. Segunda-feira, dia em que faço dois anos de casada, eis que vou (também em trabalho) para o Porto e por lá devo ficar o dia e a noite toda, regressando a Lisboa às tantas da manhã…
Sinto que nestas últimas semanas o desempenho do meu trabalho tem sido apreciado, coisa que me deixa muito satisfeita, mas por outro lado, também sinto que a minha pessoal tem sido mais que negligenciada. O ano passado, primeiro ano de casada, tive o dia todo a trabalhar e este ano não será diferente. Eu já sei que esta altura é sempre muito complicada em termos de trabalho e geralmente, o dia do meu casamento, coincide sempre com um projecto que realizamos todos os anos e que envolve a nossa participação directa nos locais onde o mesmo se realiza. O ano passado estava em Lisboa, mas este ano estarei no Porto e ao contrário dos meus colegas que irão gozar um fds de 3 dias, eu terei apenas os habituais dois, já que também estarei a trabalhar no feriado…
O ter ido trabalhar durante um fds inteiro há duas semanas atrás, fez-me ganhar por parte da nossa directora, um cheque prenda de uma loja de nome conhecido. Não está mal. Gostei do gesto, apesar de ainda não ter tido sequer tempo para ir escolher um trapinho qualquer (e por este andar não o terei tão cedo).
Depois ainda há a minha operação, que é já daqui a cerca de 3 semanas. Já me ofereci para durante o tempo que estiver de baixa, trabalhar em casa. Levo o meu portátil para casa dos meus pais e uma placa de internet daqui do trabalho e meto o tempo livre a render. Sei que se quisesse não necessitava de o fazer, mas pronto, escrever nunca me custou, por isso posso sempre dar uma ajuda com os textos que são necessários despachar. O fds passado os meus pais vieram a Lisboa. Motivo? Ir ao Ikea escolher coisas para mobilar a casa nova. Mas não podiam ter escolhido pior dia: chovia a potes e era início do mês. Resultado? Centenas de pessoas tiveram a mesmíssima ideia e a ida ao Ikea transformou-se num pesadelo sem limites. Passámos cinco horas enfiados na loja, para escolher uma cama, cómoda, mesas de cabeceira, comprar meia dúzia de ‘bibelôts’, um espelho gigante para o hall de entrada e pouco mais. Ainda fiquei incubida da tarefa de comprar um colchão ao meu gosto, oferta do meu pai, para a minha cama nova. Acontece que eu não tenho tido tempo nem para me coçar quanto mais para ver de colchões e por este andar, chega a data da operação e eu durmo em cima do estrado…
Passaram-se muitas coisas nestas duas últimas semanas, a maior parte delas banais e sem importância, mas dignas de serem faladas e desabafadas aqui neste meu canto, mas não tenho tido oportunidade.
Espero apenas que este fds, quando regressar do Algarve, o meu marido me prepare uma surpresa maravilhosa, como ele diz que vai preparar, para pudermos relaxar os dois e comemorar antecipadamente o nosso segundo aniversário de casamento.
É que depois de termos pensado num fds romântico no Alentejo, no Algarve, em Sevilha e por último em Madrid, a sucessão de acontecimentos e reviravoltas por causa do meu trabalho, levou-nos a ficar por Lisboa, num fds de apenas dois dias…
Resta saber onde.